Governo limita dinheiro público em festas


Portaria do Ministério do Turismo reduz à metade o valor máximo de repasses para carnavais e outros eventos que formam a base do novo esquema de desvio de verbas do orçamento


Após denúncias de mau uso do dinheiro público, o Ministério do Turismo decidiu restringir a destinação de recursos a prefeituras e organizações não-governamentais (ONGs) para a realização de festas e eventos. Uma portaria publicada esta semana no Diário Oficial da União reduz até à metade o valor máximo a ser repassado a cada município e antecipa em 20 dias a proibição do repasse de recursos públicos a entidades indicadas por parlamentares para a promoção de festejos e congressos.

As novidades estão previstas na Portaria 88/10, assinada pelo ministro do Turismo, Luiz Barretto. De acordo com o texto, publicado na segunda-feira passada (13), municípios acima de 50 mil habitantes só poderão receber até R$ 600 mil por ano para a promoção de eventos de atração turística. Até a semana passada, esse teto era de R$ 1,2 milhão, valor que poderia ser rateado por até quatro congressistas, desde que a emenda de cada um não ultrapassasse R$ 300 mil. A nova regra limita esse “rateio” a dois parlamentares.

A redução também vale para cidades menores. Municípios com até 20 mil habitantes não poderão receber mais que R$ 100 mil por ano do governo federal para realizar festas e eventos. Esse teto era, até então, de R$ 200 mil. Para os municípios entre 20 mil e 50 mil habitantes, os convênios ficam limitados a R$ 300 mil. O limite, anteriormente, era de R$ 400 mil anuais.

A portaria elimina a possibilidade de repasse para ONGs. Até então, cada entidade podia receber por ano R$ 1,8 milhão por meio de convênio para a realização de eventos de apelo turístico. Prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para começar a valer a partir de 1º de janeiro de 2011, a proibição da transferência de dinheiro para institutos foi antecipada para restringir a liberação de dinheiro público para festas de natal, réveillon e carnaval, promovidas por entidades do chamado terceiro setor, algumas das quais alvos de denúncias nos últimos dias.

Com a antecipação, além de evitar o repasse para festas de final de ano, o governo espera impedir que o dinheiro prometido (empenhado) nos últimos dias de 2010 seja transferido a associações e escolas de samba, por exemplo, numa burla à LDO. O outro objetivo é destinar mais recursos para obras de infraestrutura, consideradas mais importantes que festividades na política pública do Ministério de Turismo.


A portaria ainda aumenta prazo para ONGs e prefeituras corrigirem irregularidades detectadas no plano de trabalho dos eventos – feito antes de tudo começar. Antes, o beneficiário tinha 72 horas para resolver isso. Agora, terá 15 dias a partir data da vigência do convênio.

Como mostrou o Congresso em Foco, a restrição imposta pela LDO fez os parlamentares reduzirem a mais da metade o valor destinado para bancar festas, shows e eventos no próximo ano. No ano passado, os deputados e senadores propuseram um incentivo de R$ 736 milhões para comemorações a serem realizadas em 2010 por meio de um programa do Ministério do Turismo. Na proposta orçamentária de 2011, que será votada pelo Congresso, o aporte para esse tipo de eventos baixou para R$ 256 milhões, uma queda de 65%. Dos R$ 6 bilhões propostos este ano de acréscimo ao orçamento do Ministério do Turismo pelos parlamentares, R$ 5 bilhões vão para projetos de infraestrutura, área considerada prioritária pelo governo.

Mercado de ONGs

A folia com o dinheiro público ganhou novo capítulo ontem (15). A Controladoria Geral da União (CGU) divulgou ter descoberto um “esquema escandaloso de criação e venda” de ONGs para a realização de eventos festivos de interesse turístico por meio, sobretudo, de emendas parlamentares. Em nota à imprensa, a CGU informou que identificou em Alto Paraíso (GO), cidade com menos de sete mil habitantes, uma pessoa que aparecia como dirigente de 45 entidades sem fins lucrativos.

“Uma Oscip registrada, com CNPJ, publicação feita no Diário Oficial da União, certificada pelo Ministério da Justiça, pronta, portanto, para operar, pode sair por R$ 22 mil. Se o interesse for por ONGs, existem à venda algumas registradas desde 2009, já com CNPJ e toda a documentação necessária para protocolar o processo no Ministério da Justiça. Nesse caso, o preço é R$ 9 mil e o pagamento pode ser parcelado”, afirma a Controladoria.O relatório da CGU será enviado à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal para que os órgãos tomem as devidas providências nas esferas cível e penal.

Dentro do Ministério do Turismo, a avaliação é de que o “mercado” das ONGs foi aquecido por uma determinação da pasta este ano: limitar a seis o número de convênios por entidade ao longo do ano. Na avaliação da cúpula do ministério, a compra de estatutos de entidades foi uma alternativa para driblar o que era para ser uma medida moralizadora adotada pelo MTur diante da proliferação das emendas parlamentares para eventos.

Como revelou o Congresso em Foco, o Ministério do Turismo cobra a devolução de R$ 67 milhões de prefeituras e entidades do terceiro setor que não usaram o recurso da maneira combinada com o governo federal. Desse total, pelo menos R$ 50 milhões bancaram festas populares, como carnaval, micaretas, festas juninas, rodeios e shows de música entre os anos de 2003 e 2009. Outros R$ 47 milhões foram retomados pela pasta desde o início.

No primeiro semestre, o governo federal mandou para o Congresso e conseguiu aprovar lei que transferia dinheiro de festas e eventos para obras de infraestrutura. O projeto foi enviado em abril e transformado na Lei 12.248/10.

De acordo com a assessoria do Ministério do Turismo, o aumento das verbas destinadas por parlamentares a eventos não correspondia às prioridades estabelecidas pelas políticas públicas no setor. “Com isso, os recursos destinados a eventos em 2010 foram reduzidos em quase 60%”, diz a assessoria. Nos últimos anos, o governo federal tomou outras medidas para reduzir as despesas com festas, como a limitação dos cachês dos artistas e o teto do custo dos eventos, que não podem superar R$ 1,2 milhão.


Congresso em Foco

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