Apesar de atingida por secas e chuvas, Paraíba só recebeu 0,9% dos recursos para prevenção de desastres


Num ano marcado por chuvas que deixaram milhares de desabrigados em quase todas as regiões do país, um único Estado, a Bahia, deve fechar o período como o que mais recebeu dinheiro do governo federal para a prevenção de desastres naturais. Apesar de ter sido atingida por secas e chuvas, a Paraíba só recebeu 0,9% dos recursos para prevenção de desastres, o que corresponde a um total de R$ 1,2 milhão.

Segundo levantamento da ONG Contas Abertas, dos R$ 136,4 milhões repassados, até o fim de novembro, pelo Ministério da Integração Nacional aos Estados, mais da metade - R$ 73,4 milhões (53,8%) - foram destinados à Bahia, terra do atual ministro João Reis Santana. O antecessor e padrinho de Santana é Geddel Vieira Lima, que ocupou o mesmo cargo até março deste ano, e saiu para disputar o governo baiano. Geddel ocupava a pasta desde 2007 e, pelo menos desde 2009, a Bahia tornou-se destino privilegiado do dinheiro para prevenir desastres.

A outra metade dos recursos, rateados entre o restante dos Estados, mostra o tamanho da diferença na distribuição das verbas da União. Depois da Bahia, os mais beneficiados foram Mato Grosso (com R$ 9,3 milhões, ou 6,9% das verbas), Santa Catarina e Minas Gerais (ambos com 5,7%) e Ceará (5,5%). Já os Estados que mais sofreram com as chuvas em 2010 ficaram ainda mais longe desse patamar. Pernambuco, com 41 cidades afetadas pela chuva no meio do ano, captou apenas R$ 657 mil, o que representa 0,5% da verba total destinada pelo ministério. Alagoas, que teve 19 cidades destruídas pelo mesmo temporal, sequer recebeu dinheiro do programa.

Enquanto na Bahia 3.717 pessoas perderam suas casas devido às fortes chuvas do ano, em Alagoas e Pernambuco cerca de 27 mil pessoas (em cada Estado) ficaram sem ter onde morar por causa de temporais e enchentes. (Veja quadro abaixo)

O Rio Grande do Sul, atingido por enchentes entre janeiro e fevereiro, recebeu pouco mais de R$ 800 mil (0,6% do total) da verba de prevenção. O Rio de Janeiro, que no início do ano sofreu com grandes deslizamentos em Angra dos Reis e Niterói, obteve apenas R$ 767 mil (0,6%).

Repetição

A distorção na distribuição da verba ocorre mesmo após uma recomendação do TCU (Tribunal de Contas da União) feita ao Ministério da Integração Nacional em abril. No pedido, o TCU cobrava “critérios mais objetivos” para a divisão dos recursos. O mesmo levantamento da ONG Contas Abertas feito em 2009 havia mostrado que a Bahia havia recebido 48%, ou R$ 65,4 milhões, dos R$ 135,1 milhões destinados ao programa de prevenção do ano passado.

Na época, o relator do processo do TCU, ministro Benjamin Zymler, cobrou mecanismos para “garantir que [os recursos] sejam alocados nas áreas que apresentem maior risco”, inclusive com divulgação dos critérios na internet. A única ação concreta tomada pelo ministério até agora, porém, foi a criação, em junho, de um grupo de trabalho que irá definir melhor as exigências para os repasses.

A secretária nacional de Defesa Civil, Ivone Valente, subordinada ao ministro da Integração, reconhece a discrepância e defende a adoção de critérios que priorizem as regiões mais vulneráveis.

- Tem uma fragilidade no programa de não fazer uma distribuição mais equitativa.

Ivone diz que o ministério vem cumprindo a determinação do TCU de elaborar mecanismos para tornar mais exigente a análise dos pedidos de verba. Ela contou ainda que o tribunal não viu ilegalidades na distribuição dos recursos de 2009. O grupo de trabalho designado para montar essa nova norma ainda não concluiu os estudos e não há prazo para terminar.

Consultado, o TCU, por meio de sua assessoria, informou ao R7 que a última decisão sobre o caso foi tomada em abril. Nela, o relator pediu, além da formulação de “critérios objetivos”, uma ampla reestruturação da forma como o ministério toma suas decisões. Mas não foi estipulado prazo nem sanções para o cumprimento das recomendações. Desde então, sem retorno do ministério, o processo está praticamente parado no tribunal.

Atualmente, a liberação de verbas para obras e ações de prevenção a desastres naturais já é condicionada a uma série de exigências. Para conseguir o dinheiro para fazer a contenção de encostas para evitar deslizamentos, por exemplo, o prefeito da cidade solicitante tem que apresentar um projeto baseado em estudos que mostram a real necessidade da obra e as condições que a administração municipal terá para executá-la.

Mas isso, segundo gestores da própria pasta, não impede o direcionamento político na distribuição do dinheiro. Ao receber um número de pedidos maior do que o que pode ser atendido, acaba-se optando por atender primeiro aqueles que são mais bem relacionados com o governo.

Nesta sexta-feira, quando foi divulgado o levantamento da ONG Contas Abertas, o R7 tentou falar com Geddel Vieira Lima, que reassumiu o mandato de deputado federal pelo PMDB-BA após deixar o cargo de ministro. Em ligações para seus dois celulares, a reportagem não foi atendida.

Também na sexta-feira, o R7 telefonou para a assessoria direta do atual ministro, João Santana. Recados foram deixados na caixa postal, mas não houve retorno até o fechamento desta reportagem.



R7

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